'SALAME FATIADO'
Fotos: Marcelo Camargo/ABr e Divulgação/Netflix
O ministro da Justiça Sérgio Moro (à esq.) foi criticado pelo diretor José Padilha nesta terça (7)
LUCIANO GUARALDO, no Rio de Janeiro
Publicado em 7/5/2019 - 12h37
Atualizado em 7/5/2019 - 12h52
Diretor da série O Mecanismo, José Padilha comparou o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, com o goleiro Bruno Fernando das Dores, preso em 2010 pelo assassinato de Eliza Samúdio. Para o cineasta, o juiz errou ao trocar sua posição de ídolo e herói nacional por uma associação com o presidente Jair Bolsonaro.
Na atração, cuja segunda temporada chega à Netflix nesta sexta-feira (10), Moro ganhou uma versão ficcional chamada Paulo Rigo, com o ator Otto Jr. na pele de um magistrado extremamente vaidoso. Na manhã desta terça (7), durante conversa com a imprensa, ao ser questionado se pegou leve com o Moro da ficção depois de detoná-lo em um artigo que escreveu para a edição da Folha de S.Paulo de 16 de abril, Padilha soltou o verbo sobre o atual ministro.
"Eu e a torcida do Flamengo vimos jogos contra o Botafogo em que o goleiro Bruno agarrava os pênaltis e o Flamengo era campeão. Todo mundo comemorava e achava o Bruno maravilhoso. Anos depois, ele cometeu um assassinato. Mas foi anos depois, né? Quando ele agarrava um pênalti, eu não podia criticá-lo pelo homicídio que ele cometeu porque ainda não tinha acontecido. A mesma coisa com o Moro."
"Se eu estou contando a história do começo da Lava Jato, o Moro precisa fazer as coisas que fez no início da operação. Na primeira temporada, a gente não colocou o vazamento de parte da conversa do Lula com a Dilma... A conversa aconteceu de verdade, e foi um erro processual liberar a conversa do jeito que foi liberada, é um erro que está criticada na segunda temporada. Não podia criticar isso na primeira porque não tinha acontecido. A série segue um caminho histórico", justificou ele.
O goleiro Bruno foi condenado a 20 anos e 9 meses de prisão pelo homicídio triplamente qualificado de Eliza Samúdio, em 2013. O ex-jogador também havia sido punido por ocultação de cadáver, mas a pena foi extinta, porque a Justiça entendeu que o crime prescreveu. Ele só deve ter direito à progressão de pena para o semiaberto em 2023.
Padilha foi ainda mais crítico ao dizer que Moro foi de herói nacional a um "salame fatiado" do atual presidente. "O Bolsonaro está negociando a reforma da Previdência e está usando o Moro como moeda de troca. 'Se eu tiro o caixa 2 do pacote, vem o voto do centrão'. O Moro saiu de herói nacional para salame fatiado e entregue em pedaços para o centrão poder aprovar a reforma da Previdência", detonou.
Para o diretor de Tropa de Elite (2007), o ministro da Justiça se mostrou burro ao aceitar um cargo no governo Bolsonaro. "Eu escrevi [na Folha] sobre a burrice incrível que o Moro cometeu ao se associar ao atual presidente do Brasil. Escrevi sobre a tragédia pessoal do Moro --que, se for inteligente, deve estar extremamente arrependido das escolhas que fez", arrematou.
Apesar das críticas ferrenhas, Padilha não nega que Moro foi importante para o Brasil.
"A gente tem um sujeito que era um juiz de primeira instância, que foi extremamente corajoso na série de coisas que ele fez, que não haviam sido feitas antes, ele entendeu a importância da nova legislação. Não só ele, o Ministério Público entendeu a delação premiada, iniciou o processo que é a Lava Jato. Ela tem, para falar uma palavra intelectual, um valor heurístico, revelou para o Brasil o grau de corrupção. Concorde ou discorde da Lava Jato, ela revelou alguma coisa", filosofou.
A segunda temporada de O Mecanismo se passa em 2014, após as eleições presidenciais que reelegeram Janete (Sura Berditchevsky, fazendo as vezes de Dilma). A delegada Verena (Carol Abras) já prendeu 12 dos 13 principais empreiteiros do Brasil. Fica faltando um, o maior de todos: Ricardo Brecht (Emilio Orciollo Netto, em clara alusão a Marcelo Odebrecht).
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