LÍNGUA FERINA
REPRODUÇÃO/TV GLOBO
Beatriz Segall e Debora Bloch, as duas atrizes escaladas para viver Odete Roitman, vilã de Vale Tudo
Parte do público ficou de cabelo em pé quando a autora Manuela Dias falou que iria "humanizar" a vilã Odete Roitman no remake de Vale Tudo. A roteirista chegou a dizer que "falar mal do Brasil não é mais legal". Mesmo assim, ela colocou um certo veneno na boca da antagonista --a ser interpretada por Debora Bloch na nova versão.
Os primeiros blocos da próxima novela das nove mostram que o desprezo da megera pelo próprio país segue lá depois de mais de três décadas. Ela vai, por exemplo, achar um absurdo que o filho Afonso (Humberto Carrão) opte por trabalhar no braço nacional da empresa da família.
Manuela opta por uma Odete mais "naturalista" do que a interpretada por Beatriz Segall (1926-2018), com bordoadas muito mais sutis do que as de 1988. A perua segue como representação do que há de pior na elite cultural e econômica do país, acentuando ainda mais o "complexo de vira-lata" dela.
O termo foi proposto por Nelson Rodrigues (1912-1980) em 1950, tornando-se ainda mais popular nos últimos anos, com as redes sociais. Trata-se do sentimento de inferioridade que alguns brasileiros sentem em relação a outros países --especialmente os Estados Unidos e os da Europa.
Odete, por exemplo, vai dizer que não é necessário fazer faculdade para conseguir um bom trabalho por aqui. Ela vai considerar que investiu dinheiro à toa para que Afonso estudasse em uma renomada universidade norte-americana --em mais uma mudança em relação à original.
"Eu não gastei uma fortuna com a educação desse menino para ele trabalhar no Brasil. Se fosse para ficar aqui, ele podia ter feito um supletivo qualquer, não precisava ter ido para Harvard", disparará.
A Globo não pediu para Manuela Dias mexer nos primeiros roteiros de Vale Tudo após a entrevista dela à Folha de S.Paulo em 13 de outubro. Boa parte dos textos que estão na mão da equipe são os mesmos que haviam sido enviados para a produção no início de setembro.
O trecho destacado pela reportagem, em que Odete critica o Brasil, deve ser exibido só no segundo mês do remake, mas foi enviado para a produção um dia antes de as declarações viralizarem nas redes sociais.
Como a própria Manuela revelou, os trabalhos já estão bem adiantados na sala de roteiro, com cerca de um terço da novela já escrita. Essa é uma nova demanda da Globo para facilitar a produção e diminuir custos, ao contrário do que a emissora fazia até o início dos anos 2000 --quando não eram incomuns os atrasos nos bastidores, com atores e diretores vivendo na corda bamba com uma frente quase inexistente de episódios gravados.
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