NANEGO LIRA
JOÃO LIRA/DIVULGAÇÃO
Símbolo do teatro paraibano, Nanego Lira interpreta o padre Zezo na novela Mar do Sertão
Quando o assunto é Lorena (Mariana Sena), o padre Zezo (Nanego Lira) dispensa a batina, arregaça as mangas e faz o que for preciso. O personagem de Mar do Sertão deixou isso bastante claro quando socou Vanclei (Marcelo Mello Jr.) para proteger a filha de criação. Mas esse lado durão do sacerdote ficará mais evidente nos próximos capítulos da novela das seis da Globo. Afinal, um segredo sobre a mocinha logo virá à tona.
O intérprete já gravou as cenas dessa revelação misteriosa, mas se esforça para não dar nenhum spoiler ao Notícias da TV. Acaba deixando escapar alguns detalhes, empolgado com a conversa. Afirma que a reviravolta suscitará reflexões ("Por que abandonar uma criança? É justificável ou não? A gente julga o pai ou a mãe que abandonou, mas é muito fácil julgar") e menciona uma cena com a pastora Dagmar (Heloísa Jorge), na qual ela critica o pároco pelo soco em Vanclei.
Ele não entrega mais que isso nesse primeiro momento. Retorna ao seu raciocínio inicial e cita a humanidade de seu personagem, que acolheu a órfã apesar de não estar preparado para ser pai.
Quando a pastora volta a ser citada na conversa, ele fica vermelho e dá um sorriso nervoso, ciente das suspeitas dos espectadores: será que a pastora realmente é mãe biológica de Lorena? Tudo indica que sim.
Posso dizer que essa relação do padre com a pastora vai desdobrar em várias outras coisas. Algumas já estão apontadas. O público já percebeu quais serão os caminhos desses personagens (risos). Tem a ver com a Lorena, tem a ver se ele e a pastora terão ou não uma relação, enfim.
Com "relação", ele de fato quer dizer um vínculo amoroso. Lira é da opinião que padres não deveriam seguir o celibato compulsório. "Sexo é a base da vida", argumenta. Tampouco crê na ideia de que constituir família atrapalharia o trabalho do sacerdócio.
"Muito pelo contrário, ensina. Ensina a ser mais humano, olhar com outro olhar, porque os filhos dão exemplo aos pais. O pai aprende e ensina, e isso, eu acredito, faz com que nos tornemos um ser humano melhor".
Lira sabe bem do potencial de criar um filho. Ele tem dois: um homem de 25 anos e uma mulher de 37. E a experiência de ser pai, junto a tantas outras de sua vida, foram essenciais na construção de Zezo. Embora tenha se inspirado em padres icônicos da dramaturgia brasileira, como o Romeu (Maurício Tizumba) de Saramandaia (1976), foi um sacerdote da sua infância que deu o tom do personagem.
"Naquela época, os padres já não usavam mais batina no dia a dia, mas o monsenhor Vicente nunca tirou a dele", conta. O ator ainda lembra do cheiro de charuto impregnado na batina, cinza de tanta sujeira. "Ele era intelectual, culto, mas era um cara ranzinza, abusado, ignorante. O Zezo tem muito a ver com isso."
reprodução/tv globo
Nanego Lira como o padre Zezo da novela
O padre rabugento não foi a única lembrança de sua infância que ele aplicou na novela. O artista cresceu na cidade de Cajazeiras, interior da Paraíba, bem na divisa com Pernambuco e Ceará.
Sua casa era de frente ao melhor jogador de futebol da cidade, Perpétuo Correia Lima (1939-1977). Ainda hoje, o maior estádio da região é conhecido como "Perpetinho".O futebolista jogava no Atlético Cajazeirense, rival histórico do Sousa, time da cidade vizinha. Lira mencionou o "clássico do sertão" em uma cena da novela, e, na mesma hora, suas redes sociais foram inundadas pelos conterrâneos.
"Foi como viver um pequeno tsunami", brinca ele. De fato: momentos antes de conversar com a reportagem, ele havia cedido duas entrevistas a jornais locais e repostado a cena dezenas de vezes nas suas redes sociais. Espectadores filmaram as TVs e marcaram o ator, e ele compartilhou tudo o que via pela frente. Sua publicação mais recente à época tinha o dobro de comentários que as demais, a maioria citando a menção ao time. Para ele, é um exemplo do poder da representatividade.
"Quando você fala do seu universo particular, você está falando de você para o mundo. E essa mensagem chega com muito mais força", afirma. "E o Mario Teixeira [autor de Mar do Sertão] escreve a novela falando dessa identidade por meio do povo. A história do povo nordestino é a história do povo brasileiro. A história de fome, da miséria, da luta por sobrevivência."
Nanego Lira, contudo, já era conhecido em Cajazeiras muito antes de mencionar o Atlético. Ele atuava desde criança, mesmo sem saber. No começo, ele e os irmãos se reuniam para ler contos de fada e interpretar os personagens. Pegaram gosto pela coisa, e o irmão mais velho, Eliezer, arranjou um espaço para eles se apresentarem aos fins de semana.
Quando se deu conta, ele e os irmãos já estavam participando do encontro de teatro feito por crianças. Foi lá que conheceu Everaldo Pontes, um pouco mais velho, e eles fizeram vários trabalhos juntos desde então. Foram 20 anos só com a peça Vau da Sarapalha, inspirada no conto de Guimarães Rosa (1908-1967). Eles também se encontraram na novela das seis: Pontes interpretou Adamastor, o homem que salvou José (Sergio Guizé) da morte na primeira fase.
Três dos irmãos do ator também construíam suas carreiras artísticas. Buda Lira é produtor cultural, ator e diretor; Soia Lira é atriz; e Bertrand Lira é diretor de cinema, documentarista e pesquisador.
Criado numa cidade interiorana de porte médio, Nanego Lira é fiel testemunha de que um padre tem poder no sertão. Fora o prefeito e o delegado, é a figura mais respeitada numa religião. Já foi mais, pois o crescimento das igrejas protestantes mudou um pouco a configuração das cidades sertanejas, mas eles ainda têm poder.
É um fardo pesado para Zezo, que tem de administrar a cidade praticamente sozinho. O prefeito e o delegado de Canta Pedra, afinal, não hesitam em desviar dinheiro de um "matuto" ou dar uma festa com verba pública. Enquanto isso, o padre tem de fazer vista grossa para as artimanhas de Timbó (Enrique Diaz) e pegar lojistas corruptos pelo colarinho.
São atitudes que certamente seriam reprovadas pelo Vaticano, mas o sacerdote fictício teve de abrir algumas exceções:
O padre sabe quem é o Timbó. Ele é um malandro, mas é ingênuo. Leva suas vantagens naquela miséria, naquele contexto dele. As pessoas se deixam enganar. Ele diz que faz o que faz pelo bem do povo, e acaba sendo. A farsa da compadecida era para salvar Zé Paulino; com o santo falso, ele arrecadou dinheiro para Adamastor ir embora... Ele é uma boa pessoa. É o que resta para ele.
reprodução/tv globo
Timbó leva bronca de Zezo
Para Lira, sortudas são as cidades que têm um padre como Zezo. Sim, ele é brigão e pavio curto, mas quer o bem de Canta Pedra. Aliás, se dependesse do ator, Zezo seria ainda mais intenso. Um diretor, Bernardo Sá, pediu para o artista baixar o tom nas primeiras gravações. "Ele disse: 'Nanego, você tem que diminuir essa energia, a história só está começando. Você ainda vai ter que dar um soco numa pessoa, e já está no limite da braveza'".
Explosivo ou não, Zezo é um exemplo. A amizade com a pastora Dagmar é um símbolo de tolerância religiosa, assim como casa com o novo momento da Globo, que está mais alinhada aos evangélicos --a nova novela das sete, Vai na Fé, é um exemplo dessa posição. Mas Lira torce para que a emissora explore o lado B das religiões.
"A fé sempre foi usada pela política, pelos próprios religiosos, em prol de coisas não muito republicanas. A gente está vivendo num Brasil que exacerbou o uso político da fé em prol de ideais nem um pouco republicanos [...] Eu acredito, pelo histórico da Globo, que esse abuso em prol de uma política fascista e nazista esteja na pauta", diz.
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Mar do Sertão: Resumo dos capítulos da novela da Globo - 17 a 18/3
Sexta, 17/3 (Capítulo 179)
Capítulo não divulgado pela emissora.
Sábado, 18/3
Reapresentação do último capítulo.
Os capítulos de Mar do Sertão são fornecidos pela Globo e estão sujeitos a alteração sem aviso prévio
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