Violência
Reprodução/TV Globo
Felipe Prior no programa Rede BBB, logo após sua saída do reality; ele é acusado de estupro e abuso sexual
FERNANDA LOPES
Publicado em 3/4/2020 - 12h50
Atualizado em 3/4/2020 - 13h14
Fora do BBB20 desde terça-feira (31), Felipe Prior terá de responder a duas acusações de estupro e uma de tentativa de estupro. Três mulheres afirmam que o arquiteto cometeu essas violências nos anos de 2014, 2016 e 2018, de acordo com documento protocolado no Departamento de Inquéritos do Fórum Central Criminal em São Paulo, em 17 de março de 2020. Todas as vítimas dizem ter ficado traumatizadas.
O documento, chamado notitia criminis, é o primeiro passo para uma investigação criminal contra o ex-BBB. As advogadas Maira Pinheiro e Juliana de Almeida Valente representam as três mulheres que teriam sofrido abusos sexuais de Prior em situações diferentes.
Assim que o arquiteto entrou para o reality, nas redes sociais começaram a surgir histórias sobre suposto comportamento desrespeitoso e assediador dele durante o período em que cursou a faculdade de Arquitetura na Universidade Mackenzie, em São Paulo, e nas festas universitárias que frequentou mesmo depois de formado. As três vítimas se encontraram pelas redes sociais e decidiram denunciar Prior.
As mulheres deram depoimento exclusivo à revista Marie Claire sobre as violências que dizem ter sofrido. A primeira, chamada de Themis (nome fictício para proteger a identidade da vítima), contou que estava bêbada numa festa em 2014 quando Prior teria se oferecido para levá-la, junto com uma amiga, para casa. A amiga foi deixada antes e, quando estava a sós com o ex-BBB, ela teria sido estuprada pelo arquiteto, apesar de recusar as investidas dele e pedir para parar diversas vezes.
No caso de Themis, ela disse que o ato lhe deixou muito machucada, com um corte profundo em sua região genital. Relatou que foi para o hospital, precisou usar fralda geriátrica pela grande quantidade de sangue que perdia, ficou uma semana de cama e teve dificuldade de falar sobre o que aconteceu mesmo após começar tratamento psicoterápico. Ela ainda enfrentou crises de choro e de pânico.
"Ele é um cara impulsivo, agressivo. O que mostrou no BBB não chega perto do que é na vida real. Tenho medo do que pode fazer, mesmo diante de uma acusação formal, com advogada e tudo. Mas não posso mais guardar esse mal para mim", afirmou a suposta vítima em seu depoimento.
Dois anos depois, nos jogos universitários para cursos de Arquitetura, chamados de InterFAU, Prior teria tentado estuprar outra garota, chamada de Freya. Ele também teria se aproveitado da embriaguez dela para levá-la à sua barraca e forçar o sexo. A jovem, no entanto, diz que conseguiu se desvencilhar e fugir.
Já nos jogos InterFAU de 2018, outra garota não teria tido a mesma sorte. Prior também é acusado de levar uma jovem, chamada de Ísis, para sua barraca, mas teria começado a conduzir a relação com agressividade. Ísis o acusou de estapeá-la e estuprá-la.
A jovem disse que gritou muito, chorou e pediu para parar, mas ele teria a imobilizado e continuado. Pessoas nas barracas ao lado ouviram. Elas serviram de testemunha no documento de acusação.
"As meninas que moram comigo gostam de assistir ao BBB. Imagina ter que ver a cara dele todo dia? Mas ao mesmo tempo foi importante para que eu pensasse no passado. Eu achava que ia superar através do esquecimento. E vê-lo na TV me despertou muitos gatilhos e medo de me relacionar com homens", declarou Ísis à revista.
Procurada, a assessoria de imprensa de Felipe Prior demorou a responder à revista, e em 2 de abril, afirmou apenas que "isso é mentira". Em seguida, o assessor disse que, assim que tivesse uma posição da família, avisaria a repórter da publicação, que não teve mais respostas.
O Notícias da TV também procurou a assessoria e a família do ex-BBB para se posicionar sobre as acusações. Eles não responderam os contatos até a publicação deste texto.
A Globo se pronunciou sobre as acusações: "A Globo é veementemente contra qualquer tipo de violência, como se percebe diariamente em seus programas jornalísticos e mesmo nas obras do entretenimento, e entende que cabe às autoridades a apuração rigorosa de denúncias como estas", disse em nota.
O comportamento de Prior já era conhecido pela organização dos jogos universitários, tanto que ele é proibido de pisar em novas edições do InterFAU desde o caso de Ísis. Nas redes sociais, uma usuária questionou a comissão sobre as acusações de assédio contra ele, e o perfil oficial respondeu, em 27 de março: "Temos ciência do que está acontecendo e nos pronunciaremos no momento certo".
A advogada Maira Pinheiro explicou que seu trabalho com as vítimas começou em janeiro. "Percebemos que, para que os fatos fossem relatados com a devida profundidade e complexidade, teríamos que fazer uma investigação defensiva abrangente. E assim chegamos à segunda e à terceira vítimas e às demais testemunhas. Tivemos inclusive notícia de pelo menos uma outra, que acabou preferindo não depor", revelou.
Em relação à demora das três para tornarem públicos os abusos que dizem ter sofrido, a advogada disse que isso tem muito a ver com a falta de apoio geral que vítimas de violência contra a mulher sofrem e com a cultura do estupro.
"Percebemos que infelizmente é comum que entre a ocorrência da violência e a decisão de denunciar passe um certo tempo. Isso tem a ver com o tratamento revitimizador que muitas dessas mulheres recebem junto às instituições, a falta de apoio de amigos e familiares e, de maneira geral, com a cultura do estupro, que normaliza situações de violência sexual e não cultua a valorização do consentimento", falou à Marie Claire.
"Todas as vítimas relataram sentimentos de culpa após os fatos. Isso é emblemático, pois revela como, diante desse tipo de caso, o senso comum tende a focar mais numa suposta 'responsabilidade' da vítima em não ser capaz de evitar os atos do agressor", complementou.
As advogadas já entraram com pedidos de medidas cautelares para que Prior seja impedido de manter contato com as três mulheres por qualquer meio de comunicação. No Brasil, o crime de estupro é hediondo (ou seja, não cabe fiança) e a pena é de seis a 10 anos de reclusão, que pode aumentar para oito a 12 anos quando há lesão corporal da vítima.
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