Memória da TV
Divulgação/TV Manchete
Elenco de O Marajá, minissérie da extinta TV Manchete que nunca foi ao ar
THELL DE CASTRO
Publicado em 27/9/2015 - 6h27
Um dos episódios mais enigmáticos da história da televisão brasileira envolve a extinta Manchete e o ex-presidente e atual senador Fernando Collor de Mello. Em 1993, o político conseguiu na Justiça impedir a estreia da minissérie O Marajá, sobre sua trajetória. A produção acabou sendo liberada pelos tribunais, mas, misteriosamente, as fitas com os capítulos desapareceram.
A situação da emissora era crítica naquele ano. Atolada em dívidas, havia acabado de ter seu controle retomado por Adolpho Bloch (1908-1995), após a fracassada venda para o grupo IBF. O Marajá era a esperança para conquistar audiência e receitas e, assim, aliviar a crise. Mas não deu certo.
Na história, Hélcio Magalhães vivia Elle, presidente de um país fictício que queria ficar no poder durante 30 anos _até 2020. Claro que Elle era baseado em ninguém menos do que Collor. A narrativa seria conduzida por três narradores, um deles Luiz Armando Queiroz.
A minissérie, escrita por José Louzeiro, Regina Braga, Eloy Santos e Alexandre Lydia, com direção de Marcos Schechtman, foi gravada com uma única câmera e reaproveitando cenários e figurinos de outras produções da casa. O item mais precioso era uma Mercedes Benz, ano 1975, propriedade de Adolpho Bloch, emprestada para ser o carro de um assessor do presidente. A Folha de S.Paulo de 25 de julho de 1993 classificou a obra como “produção digna de TV artesanal”.
O Marajá foi gravada em tempo recorde. Tinha previsão de 80 capítulos _15 estavam gravados e cinco editados para a estreia, que seria dia 26 de julho de 1993. No elenco, figuras carimbadas da casa, como Julia Lemmertz, Rubens Corrêa, Antônio Petrin e Ângela Leal, entre outros. Sósias, como o do tesoureiro Paulo César Farias (1945-1996), também apareciam, mas sem falas.
Collor, que deixou a Presidência da República um ano antes, entrou na Justiça e conseguiu proibir a exibição da minissérie, alegando que “havia risco de danos irreparáveis”. A decisão saiu no sábado (24), mas a emissora só foi informada pelos oficiais de justiça às 18h do dia da estreia, uma segunda-feira.
Os advogados do canal tentaram cassar a liminar, na expectativa de exibir a atração, programada para as 21h30. O Jornal da Manchete foi prorrogado até 21h50, mas não funcionou. A solução foi antecipar a estreia de outra minissérie, A Chave para Rebeca, que iria ao ar às 22h15.
O elenco, que estava reunido no prédio da Manchete para celebrar a estreia, ficou decepcionado com a censura, já que a emissora afirmava que havia respaldo jurídico para a produção. Foi feito um protesto, inclusive com entradas ao vivo durante a programação da emissora. O então diretor Fernando Barbosa Lima declarou: “Temos a obrigação ética de levar essa minissérie ao ar”.
A produção, se liberada, só poderia ser exibida após o julgamento da ação, o que demoraria mais de 60 dias.
Mistérios
No início de 1994, O Marajá teve sua exibição liberada pela Justiça, mas com cortes. A Folha de S. Paulo de 27 de fevereiro de 1994 informou que “mesmo liberada com cortes pela Justiça, o dono da emissora, Adolpho Bloch, proibiu a veiculação da série antes do veredicto final do STF (Supremo Tribunal Federal). Não quer mais disputas com a família Collor”.
Em 2 de maio de 1999, a mesma Folha de S. Paulo fez uma reportagem informando que as fitas da minissérie continuavam desaparecidas: “Há, até aqui, somente uma pista do paradeiro das fitas. O ex-diretor-geral da Manchete, Fernando Barbosa Lima, afirma que o próprio Adolpho Bloch decidiu guardar as fitas, com medo de que fossem roubadas, e a Manchete, prejudicada.
“Ele ficou assustado com o poder de Collor”, conta Barbosa Lima, que era amigo de Bloch. Com a morte de Bloch, em 1995, a emissora passou para as mãos de Pedro Jacques Kapeller, e as fitas estariam em seu poder.
E o mistério permanece até os dias de hoje. Ninguém sabe do paradeiro das fitas, e O Marajá continua inédita.
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