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O MECANISMO

Lava Jato ganha série didática (até demais) para ser entendida no mundo todo

Karima Shehata/Netflix

Leonardo Senna (à esq.) e Caroline Abras em cena de O Mecanismo: Lava Jato para leigos - Karima Shehata/Netflix

Leonardo Senna (à esq.) e Caroline Abras em cena de O Mecanismo: Lava Jato para leigos

LUCIANO GUARALDO, no Rio de Janeiro

Publicado em 22/3/2018 - 5h52

Se explicar a Operação Lava Jato para brasileiros já é tarefa complicada, tentar expô-la para o público mundial parece missão impossível. Mas o cineasta José Padilha e a roteirista Elena Soarez toparam o desafio e, em O Mecanismo, que chega amanhã (23) à Netflix, fazem um relato didático sobre o trabalho da Polícia Federal. Didático até demais.

Os delegados Marco Ruffo (Selton Mello) e Verena Cardoni (Caroline Abras) são os "professores" da série. Também narradores, eles ensinam em minúcias a função de cada personagem, dão detalhes sobre como acontecem os esquemas de corrupção, os desvios de dinheiro e até apontam quem é mocinho e quem é vilão.

"Se você precisa explicar algo muito complexo, é melhor usar a narração em off do que colocar dois personagens conversando em cena não para dizerem o que querem, mas para o público entender. Um diálogo fica expositivo demais, sabe?", justifica Padilha, defendendo que centenas de filmes já usaram o mesmo recurso antes dele em Tropa de Elite (2007), Tropa de Elite 2 (2010) e Narcos.

E, em O Mecanismo, os personagens têm muito para explicar: desde a complicada ligação de Marco Ruffo com o doleiro Roberto Ibrahim (Enrique Diaz), ex-colegas de infância que foram parar em lados opostos da lei, até a relação da Polícia Federal com o Ministério Público e com a Justiça, tudo é didaticamente ensinado.

"Nós temos dois níveis de complexidade que tornaram o off instrumental. Primeiro, a própria Lava Jato, que tem várias fases, é uma operação muito aberta, espalhada, com centenas de envolvidos. Segundo, tem o fato de que a série será exibida em vários países. Explicar para um americano o que é um doleiro não é fácil", diz Elena.

Apesar de Ted Sarandos, chefe de conteúdo da Netflix, defender que corrupção é um tema de apelo mundial, algumas especificidades da sujeira no Brasil são incompreensíveis para estrangeiros. Mas essa dificuldade de entendimento no exterior foi um problema facilmente resolvido pela equipe de O Mecanismo.

"Como a Netflix é uma empresa americana, assim que os executivos liam os roteiros já iam sinalizando tudo aquilo que eles não entendiam. O que parece óbvio para os brasileiros não faz tanto sentido lá fora, então assim que chegava o retorno nós já sabíamos o que seria ou não compreendido", explica a roteirista.

pedro saad/netflix

Cláudio Mendes (à esq.), Alessandra Colasanti e Enrique Diaz vivem os "vilões" da nova série

Corrupção vira entretenimento
Didatismos à parte, O Mecanismo consegue transformar uma parte vergonhosa da política brasileira em entretenimento. A narrativa se assemelha a um suspense policial, com Ruffo e Verena conduzindo a trama conforme a investigação avança. É curioso ver que nem mesmo os dois agentes imaginam as proporções que o caso tomará, com uma operação que começa pequena, com apenas três policiais.

Também chama a atenção que a série seja construída como uma obra de ficção apenas inspirada em fatos reais. Os personagens têm nomes fictícios, embora qualquer um que tenha acompanhado a Lava Jato da vida real consiga identificar que Roberto Ibrahim é Alberto Youssef, que a "presidenta" Janete (Sura Berditchevsky) é Dilma Rousseff e que a empresa Petrobrasil representa a Petrobras.

A produção da Netflix acerta em cheio ao deixar a politicagem como pano de fundo para mostrar os personagens. A dinâmica de gato e rato de Ruffo e Ibrahim prende o público logo de cara (mais pelo talento de Enrique Diaz, com carisma de sobra para tornar o doleiro uma pessoa quase agradável), e a tensão gerada pela possibilidade de as tocaias darem errado a qualquer momento também atrai.

Enfim, O Mecanismo pode ser encarada de duas formas: como série de ficção, é um bom entretenimento; como docudrama, é quase uma aula de história com nomes trocados. Não é muito diferente, portanto, do que o mesmo Padilha fez com Narcos: transformar fatos reais em uma narrativa envolvente. Mas que, dessa vez, toca numa ferida muito mais próxima dos brasileiros do que o narcotráfico colombiano.

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