Hits chicletes viram marketing (e dor de cabeça) de R$ 13 mi para montadoras

Se em 2012 os brasileiros cantarolavam Camaro Amarelo, da dupla sertaneja Munhoz & Mariano, e faziam menções orgânicas ao modelo de luxo da Chevrolet, o foco dos principais cantores da atualidade está nos veículos fabricados por marcas como Porsche, Toyota, Ford e RAM. Entre uma estrofe com cunho sexual e um refrão chiclete, esses hits se transformaram em uma indústria que gera mais de R$ 13 milhões em publicidade gratuita para as montadoras.

A cifra foi calculada pela Valometry, agência especializada em dados para estratégias de branding, a pedido do Economia Real, site de finanças e negócios que o Notícias da TV lança em breve, com a proposta de traduzir o economês para pessoas físicas e micros, pequenos e médios empreendedores.

Para chegar a essa projeção, os especialistas calcularam o custo hipotético de publicidade que as marcas teriam investido caso precisassem pagar por anúncios nos clipes dessas músicas no YouTube.

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"Dificilmente elas pagaram alguma quantia para os artistas produzirem essas canções. No entanto, como as letras repetem os nomes dos carros e mostram os veículos nos clipes, podemos considerar esses conteúdos como um product placement involuntário", afirma Marcelo Mattar, diretor de dados e vendas da Valometry, ao citar a estratégia de marketing na qual produtos aparecem integrados a conteúdos como filmes e novelas.

Outro exemplo dessa prática é a canção Descer pra BC, da dupla Brenno e Matheus. O sucesso da música tornou-se uma publicidade para Balneário Camboriú (SC), mesmo sem um investimento de marketing dos órgãos públicos e privados.

Caso alguma entidade tivesse pago anúncios em todas as reproduções do clipe no YouTube, seria necessário desembolsar, no mínimo, R$ 1,3 milhão. "Além disso, essas canções viralizam nas redes sociais, o que amplifica as reproduções e torna praticamente impossível calcular o eventual retorno financeiro", destaca Mattar.

A reportagem encontrou sete canções de artistas do agronejo (gênero que mescla sertanejo com pop, funk e eletrônico) com citações a carros de luxo nos últimos anos. Confira na tabela abaixo:

No levantamento, são consideradas apenas as músicas que citam nominalmente algum modelo de veículo ou fabricante. Por exemplo, na canção RAM Tchuuu, a dupla Antony e Gabriel menciona Dodge Ram, primeiro nome da linha de picapes da marca Ram, atualmente chamada de Ram 1500.

Já na canção RAM Tchum, os artistas Dennis, Ana Castela e MC GW não dizem explicitamente o nome de nenhuma marca, apenas reforçam na letra que a canção é sobre uma caminhonete. Por isso, essa canção não está presente no estudo.

Fã ou hater?

Do ponto de vista de branding, o maior problema dessas músicas é a associação dos produtos a aspectos que não estão relacionados ao seu imaginário original, além da questão legal de explorar financeiramente uma marca pertencente a outra companhia sem autorização prévia.

Em entrevista ao UOL Carros em 2016, executivos da Chevrolet afirmaram que o hit de Munhoz & Mariano "atrapalhou bastante" as vendas do veículo, tanto que a companhia teve que investir em uma campanha para limpar a imagem de ostentação do carro e associá-lo novamente a fatores como performance e luxo. Contudo, na primeira década de lançamento do novo Camaro, o superesportivo vendeu 6,5 mil unidades, mais do que o dobro do rival Ford Mustang.

Segundo os dados oficiais da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), na comparação de 2024 ante 2023, os modelos Hilux e Silverado apresentaram crescimento de 57,6% e 74,2%, respectivamente, na venda direta (quando o carro é comprado diretamente da montadora). As músicas Dentro da Hilux e Silverado foram lançadas nesse intervalo de tempo. Os demais veículos presentes no estudo não foram encontrados na base da Fenabrave.

"No Carnaval de São Paulo, a Rosas de Ouro apresentou um carro alegórico com diversos personagens da franquia Super Mario Bros. Não sabemos se ela pediu autorização da fabricante Nintendo, mas esses personagens entram na nossa cultura e os usamos para expressar nossa identidade. No Carnaval do Rio, a Volkswagen apresentou um novo modelo ao mercado, aproveitando a audiência do evento", explica Mattar, que prossegue:

Esses veículos fazem parte do imaginário aspiracional do brasileiro, sobretudo no interior do país, e as canções refletem essa realidade. Assim, as músicas tornam-se involuntariamente uma publicidade para as marcas, e cabe a elas decidirem aproveitar esse hype ou não, tendo em vista que os veículos entram na boca do povo, mas muitas vezes não representam a essência do público da marca.

Como as montadoras avaliam essa publicidade?

Procurada pelo Economia Real, a Jaguar Land Rover disse que "não possui qualquer relação oficial com a música, seus compositores e intérpretes. Dessa forma, não há comentários sobre o assunto".

A RAM afirmou que não pagou os artistas citados na reportagem para produzir as canções e acredita que não existe uma conexão direta entre as músicas e as vendas dos veículos, pois trata-se de um "fenômeno cultural".

"Para a Ram, existe um aspecto e conexão muito forte da marca com o agro e que naturalmente traz também uma ligação com a música sertaneja. A marca inclusive tem parcerias com alguns artistas, pois entendemos que é importante estar presente em territórios que tenham aderência com nosso público e traga autenticidade. Nesse aspecto, a nossa proposta não é criar publicidade, mas sim criar conexões verdadeiras com todo o universo cultural das nossas audiências", destacou a marca da Stellantis, que tem acordos comerciais com a dupla Chitãozinho & Xororó e a cantora Lauana Prado.

A General Motors/Chevrolet informou que não pode participar da pauta, enquanto Toyota, Porsche e Ford não responderam os questionamentos da reportagem.

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