Pânico, 10 anos
Fotos: Divulgação/Reprodução
Emilio Surita em evento da Band: o Pânico é um programa masculino, mas fala com a molecada
DANIEL CASTRO
Publicado em 27/9/2013 - 20h15
Atualizado em 28/9/2013 - 5h34
Leia a seguir a íntegra da entrevista exclusiva concedida por Emílio Surita ao Notícias da TV (para ler só o resumo desta entrevista, acesse: "O humor está mais bundão hoje em dia):
NTV – Você imaginava lá atrás que o Pânico chegaria a dez anos?
Emilio Surita – A gente começou o Pânico arriscando. Tínhamos um patrocínio de três meses, da Vivo, que foi o primeiro que o Tutinha [criador do programa] arrumou. Tivemos de setembro até dezembro para acontecer alguma coisa. E depois foi assim. Ele [Tutinha] vendeu mais uma cota de patrocínio e conseguiu mais dois meses para a gente fazer a praia [programas de verão].
Antigamente se falava que programa de humor não vende, não consegue patrocínio. Mas o Pânico foi pegando, foi acontecendo. E em televisão não se comemora, se sobrevive, toda semana tem de dar resultado. É difícil ter um programa que fique dez anos no ar. É muito trabalho, o programa foi mudando, a gente foi se moldando ao público, mudamos muitas vezes de horário, porque tivemos problemas com classificação indicativa. Saímos das seis da tarde e fomos para as oito, eram outros concorrentes.
NTV – Na sua avaliação, o programa mudou muito em sua essência?
Surita – Estamos em um horário muito competitivo. Então Pânico deixou de ser um programa só de humor e passou a cobrir também política, a fazer pauta de comportamento, se adequou ao horário. Você tem Domingo Espetacular, Fantástico, Silvio Santos, e você não pode perder a essência do seu público, que é a molecada, mas você também tem que pegar a avó do cara, o pai, a família, tem de agregar audiência.
NTV – O perfil do público é predominantemente de 11 a 17 anos?
Surita – Nesse público a gente é primeiro lugar do começo até o final. Mas tem que agregar mais público se não fica como a MTV, só vai representar aquela parcela. Não adianta nada ter só um público específico.
NTV – O Casseta & Planeta durou 20 anos. Você acha que o Pânico também vai durar 20, 30 anos?
Surita – Ah, não sei. Não tenho a menor ideia. Sempre ouvi essa história “Ah, isso aí não vai durar, isso aí é uma moda”. Tem que trabalhar, achar o que o cara quer assistir, tem de ter o patrocínio. Tem de chamar a atenção toda semana.
Emílio Surita com Hebe Camargo na Rede TV!
NTV – Houve algum momento em que você pensou em desistir?
Surita – Não, porque é gostoso, a gente trabalha com um pessoal legal, está junto desde o começo. É gostoso fazer o Pânico. Tem desgaste, tem pressão, você disputa só com cara bom de televisão, e a gente não tem toda essa experiência. O processo de criação do Pânico é muito legal, todo mundo participa. O editor dá sua contribuição, a produção, o câmera. A criação é feita por todos, não por um redator.
NTV – O Pânico criou uma linguagem?
Surita – Não sei se criou uma linguagem. Todo mundo vem de uma referência, gosta de Monty Python. Quando o CQC veio para cá, eles chegaram com um parque tecnológico muito legal, tinha os efeitos. A gente não tinha isso. A gente tinha um Maczinho que faz um desenho muito tosco. Quando a gente viu aquilo lá a gente disse: "E agora, o que podemos fazer?". Aí a gente inventou aquelas vinhetinhas, o “Ronaaldo”. E acabou pegando.
NTV – Os críticos do Pânico dizem que o programa faz um humor Jackass, de constrangimento, que isso não é humor. Como você reage?
Surita – O Pânico tem muito de Jackass, tem muito de constrangimento, porque esse programa começou assim, o espírito dele sempre foi esse na rádio. Tem muita gente que fala mal e tem gente que gosta, não tem unanimidade. No primeiro momento, tudo o que é novidade no humor todo mundo gosta. O primeiro trabalho do cara é genial, o segundo é apelativo. O humor tem essa característica, tudo o que é legal é a revelação.
O gostoso do nosso trabalho é tentar se adequar ao gosto do público, entender a cabeça do cara que está assistindo. Quem é aquele cara? A gente sabe que ele é homem, dono do controle remoto, que já assistiu ao futebol, que a mulher do cara sai de lá [da sala] e vai cuidar do café da manhã da molecada.
À medida que o tempo foi passando, a gente entendeu que o Pânico tem de ser masculino mesmo, porque o público que está assistindo é masculino. Então o cara fala “Ah, o Pânico tem muita mulher!”. Pô, é como uma padaria deixar de fazer pão porque encheu o saco. Tem que agradar quem está em casa.
NTV – Qual foi a fase mais difícil que o Pânico passou?
Surita – A gente já passou por tudo. Acho que não tem nada difícil, para tudo você acaba dando um jeito, acaba driblando. A dificuldade vira conteúdo do seu programa. Tudo o que a gente sofreu de dificuldade a gente inventou uma história para fazer o conteúdo e aquilo virar parte do show.
NTV – Cite um exemplo.
Surita – Quando a gente sofreu uma perseguição de Brasília, que os caras [do Ministério Público Federal] vieram com ONGs e falaram que iam tirar o programa do ar, que iam falar com todos os patrocinadores, fizeram um Termo de Ajustamento de Conduta. Falaram que não podia ter anão, loira, mulher, não pode isso, não pode aquilo. Eu falei “Se a gente assinar isso aqui, o nosso programa acaba”. E aí a gente inventou uma história da Sabrina, que era culpa da Sabrina, e acabou criando outro quadro e a gente sobreviveu àquele momento.
NTV – E o momento de glória?
Surita – Ah, não tem... Não tem descanso.
NTV – Nem na primeira vez em que o Pânico bateu a Globo por um minuto?
Surita – Você fica contente, fala "Que legal". Porque com audiência você não pode ficar muito louco, senão vira uma droga. O programa termina à meia-noite e já tem uma reunião na madrugada para discutir o próximo. Você comemora ali, mas já tem que pensar no outro programa.
NTV – O Pânico sempre pregou peças. Em 2011, uma marca de cervejas aprontou com o programa. Vocês ficaram muito putos?
Surita – Aquilo foi no início das redes sociais, o Twitter estava dominando. Eu estava em Nova York e a Amanda [Ramalho] viu alguma coisa em um site. Eu entrei lá e vi que eram duas gringas que queriam conhecer o Brasil. Vi muito rapidamente. Pedimos para uma produtora checar a história. A menina entrou no site e conversou com elas, só que não foi muito a fundo, e ela era estagiária. Recebemos as meninas no programa, e elas gravaram durante quatro dias aqui. Gravamos todo o material e começamos a colocar no ar, as Tchecas. Aí um belo dia, me liga uma menina [a jornalista Rosângela Roxo] da Folha de S.Paulo e me fala que aquilo era um viral. Aí eu entrei no Twitter, olhei de frente pra trás e comecei a ver que realmente tinha algum negócio ali. Falei: “Meu Deus, essas meninas enganaram a gente”. Mas todo mundo corre o risco de cair num negócio desses.
NTV – E vocês deram o azar de o viral ser de uma marca de cerveja e o Pânico ser patrocinado por uma cervejaria...
Surita – É, mas vai fazer o quê? Aconteceu. Tudo o que é de rede social você pode cair. Tem muita pegadinha no Facebook. A gente passou a ter mais cuidado, por exemplo, o negócio do Chiquinho Scarpa [falso enterro de um carro de R$ 1,5 milhão] a gente nem foi fazer. Falei: “Vamos checar primeiro”.
Emílio Surita com Babi Rossi, careca, já na Band
NTV – A relação com Silvio Santos hoje está estremecida?
Surita – Nós adoramos o Silvio. Ele entrou com uma ação com várias exigências, não podíamos chegar perto dele, mas ganhamos na parte da imitação. Mas não sei se ele está chateado com a gente.
NTV – Como você avalia o humor feito hoje no Brasil?
Surita – Tem muita gente boa. No Pânico, os caras são muito bons, fazem reportagem, esquete, imitação. O [Marcelo] Adnet é muito bom. Fábio Porchat, Porta dos Fundos, que achou o formato da internet, Dani Calabresa, Tatá Werneck. É difícil achar uma geração tão boa quanto essa. É uma geração boa, com pessoas inteligentes.
NTV – O Pânico contribuiu? Porque eles estão começando e o programa já é um “tiozinho”.
Surita – O Pânico apareceu em um momento que não tinha esse tipo de humor. Estávamos no apagão do FHC, não tinha muito investimento na televisão. O Pânico apareceu como uma coisa nova na televisão, mas a fonte era o Casseta e Planeta, o Ceará gostava do Tom Cavalcante. Mas o programa teve uma série de dificuldades, não tínhamos convidados, então botamos um paletó no Vesgo, dissemos que ele seria um “Amaury Jr. louco”, e o Ceará foi como Silvio Santos. Foi a primeira vez que apareceu um cara com uma peruca de Silvio Santos entrevistando os outros nas festas. Mas não pensamos em criar um modelo novo, foi pela dificuldade. Hoje em dia, o Pânico tem uma importância para essa molecada [novos humoristas].
NTV – O Pânico hoje está mais mainstream? Depois que ele foi para a Band ele deixou de ser tão marginal.
Surita – O humor está assim. Hoje você faz piada com um advogado. Qualquer programa de humor não tem muita brecha depois dessa cruzada moral que apareceu aí. Tem que ter mais cuidado, porque todo mundo está patrulhando os humoristas. O humor está mais bundão hoje em dia. Mas isso é geral, não é só no Pânico.
NTV – Isso tornou a tarefa mais desafiadora?
Surita – É muito mais desafiador, porque quando a gente começou não existia YouTube, redes sociais. Quem tem redes sociais fica mais preocupado com a imagem dele, e com o humorista é complicado porque alguém sempre é alvo da piada. É muito ruim, mas é mais desafiador, porque esse é o papel do humor, contar a piada e driblar todas essas coisas.
NTV – O Pânico teve uma fase que dava dois dígitos, hoje está mais difícil. Por quê?
Surita – O Pânico sempre deu de 14% a 15% de share. É um programa que mantém um público, tanto que saímos de uma emissora e o público acompanhou a mudança, mantivemos os patrocinadores. Conseguimos administrar bem. Mesmo com a crise no mercado, a gente está sempre na média.
NTV – Qual é a credibilidade do palhaço?
Surita – O palhaço não tem credibilidade nenhuma [risos].
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