ACUSAÇÕES
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A atriz Renata Ricci, que relatou sentir muito medo ao falar do assédio que diz ter sofrido
Atrizes e roteiristas vieram a público nesta sexta (24) para denunciarem atitudes de assédio sexual e moral que afirmam ter vivido enquanto trabalhavam sob supervisão de Marcius Melhem no departamento de programas de Humor da Globo. Elas contaram que o humorista e ex-chefe do núcleo cometia atos abusivos, como roçar o pênis ereto em funcionários (homens e mulheres) em reuniões e cenas, fazer comentários sobre aspecto físico e não dar créditos a trabalhos. Muitas delas tiveram e ainda têm crises de pânico por isso. Melhem ressaltou que cometeu erros, mas negou que tenha praticado qualquer assédio.
"Estou tremendo de medo", disse a atriz Renata Ricci em depoimento para o jornal Metrópoles, que reuniu onze pessoas que disseram ter presenciado situações de assédio de Melhem para falar sobre o assunto. São elas: as atrizes Dani Calabresa, Renata Ricci, Georgiana Góes, Veronica Debom, Maria Clara Gueiros, as roteiristas Luciana Fregolente e Carolina Warchavsky, os diretores Cininha de Paula e Mauro Farias, e os atores Marcelo Adnet e Eduardo Sterblicht.
A atriz Georgiana Góes começou relatando que havia camadas da relação com o chefe que ela não percebia que se tratavam de assédio; só foi entender após o caso de Dani Calabresa vir à tona. Georgiana contou que tinha receio de andar de carro sozinha com Melhem e que ele fazia comentários sobre sua aparência. "Nem sempre a coisa está tão exposta como a gente imagina", disse.
Já Luciana Fregolente contou um episódio em seu primeiro dia de trabalho que a deixou bastante incomodada. "Ele abriu a porta para mim de cueca. Naquele momento eu paralisei quando eu vi aquilo, mas ao mesmo tempo era o emprego dos meus sonhos, sabe? Trabalhar com humor, na maior emissora do Brasil, eu estava superfeliz, e de repente o chefe abre a porta de cueca", relatou.
Dani Calabresa, que já veio a público antes com sua versão da história, pontuou momentos em que se sentiu incomodada nos bastidores com o ex-diretor. "Estava insustentável trabalhar em um ambiente em que eu comecei a perceber que eu era barrada dos convites; que eu não era liberada para as coisas; que eu estava trabalhando com tremedeira; que ele se aproveita das brincadeiras para brincar ereto; que ele pega de verdade; ele tenta enfiar a língua de verdade. Não é selinho, não é piada, não é brincadeira", contou.
Verônica Debom revelou que demorou para entender que o relacionamento tóxico que existia entre Melhem e ela no trabalho era errado. "Era como se ele fosse muito preocupado, ele 'protegia' a gente de vários outros trabalhos, de 'roubadas horríveis'. A gente não ficava sabendo. Ele não dava crédito [a bons desempenhos no trabalho]. A mensagem subliminar era: 'Você é um lixo'".
Eu entendi [que era abusivo], depois de muito tempo, depois da denúncia da Dani Calabresa, que salvou minha vida. Eu não sabia o que estava acontecendo. Ele detonava nossa autoestima pra manter a gente sob controle. Quando eu entendi, eu comecei a ter stress pós-traumático, comecei a ter crise de pânico, não consegui trabalhar. Tive que pedir um afastamento. Ele ficava me mandando mensagem, indo atrás de mim.
Carolina Warchavsky trabalhou como roteirista com Melhem no Tá no Ar (2014-2019) e descreve o ambiente de redação como "muito tóxico". "Foi tudo muito confuso. Quando saiu a nota da Dani, eu entendi todos os comportamentos que estavam acontecendo, entendi que era verdade. Eu tentei bloquear por um tempo, mas entendi. E aí eu não conseguia voltar lá. Eu comecei a ter ataque de pânico. Eu não conseguia ir trabalhar. E, que nem a Verônica, eu tive que tirar uma licença do trabalho, pelo INSS. Fiquei em casa uns três meses. Foi um processo muito difícil."
A roteirista ainda contou que evitava dar as melhores ideias na presença do chefe, pois ele respondia: "Estou com tesão em você por essa ideia". Luciana Fregolente, também roteirista, disse que foi dela a ideia do quadro Mulheres Fantásticas, do Fantástico, e que Melhem se empolgou com o assunto, mas depois não fez questão de dar crédito a ela. A profissional ficou três dias de cama, decepcionada com o caso.
Renata Ricci se emocionou ao dar seu depoimento. Para a atriz, a denúncia de Dani Calabresa também serviu como estopim para entender os assédios que ela mesma diz ter sofrido.
"Se a Dani não falasse, eu ia levar isso pra mim, nem minha família ia saber. Não tá fácil. Se eu tô aqui, não dormi essa noite, tô tremendo de medo, tem muitas pessoas que também não estão aqui".
Luciana Fregolente e Verônica Debom afirmaram que há várias mulheres que também trabalharam com Melhem que não quiseram aparecer, mas estão ainda sofrendo as consequências, com crises de pânico, por exemplo.
Marcius Melhem também deu entrevista ao Metrópoles, na qual rebateu as acusações recebidas. Ele negou ter cometido assédio, mas admitiu que houve erros: "Eu cometi erros --eu assumo que cometi-- eu nunca disse que eu não cometi erros. Eu falei exaustivamente, várias vezes, que eu acho que cometi erros", disse.
Quando eu perguntei para a TV Globo na época [em que deixou o cargo] qual é a prova que eu tenho então que não houve assédio, eles responderam: 'A prova que você tem é a sua saída com todos os direitos e com a sua carteira de trabalho limpa'.
O ex-diretor foi categórico ao afirmar que não cometeu nada do que as atrizes e roteiristas estão acusando. Apesar disso, ele admite que pode ter passado do ponto em algumas brincadeiras, mas apenas com homens.
"Brincadeiras, coisas de abraçar --homens, eu nunca apertei mulheres. Eu nunca encostei o pênis ereto em ninguém, em nenhuma gravação. Nunca forcei beijo", afirmou ao ser questionado que tipo de comportamento ele poderia ter evitado.
Marcius Melhem contou que o ambiente do núcleo de Humor era de muitas brincadeiras e, quando se tornou chefe, quis manter a relação de amizade que já tinha com todos.
"Hoje, olhando em perspectiva, tem comportamentos e brincadeiras que a gente fazia que, eu como chefe, não deveria ter feito. Mas eu tenho que entender a minha visão da época que, para mim, que era um colega dessas pessoas, se viro chefe e resolvo tratar todo mundo diferente, eu achava que isso que era o erro", admitiu.
Melhem também afirmou que sempre teve permissão dos demais para fazer as tais brincadeiras. "Eu nunca brinquei com alguém que não brincasse de volta", pontuou. O humorista foi questionado sobre a situação relatada por Luciana Fregolente, com relação a tê-la recebido de cueca em seu primeiro dia de trabalho.
"Ela, a Maria Clara Gueiros e Verônica Debom são as artistas desse golpe aí. Luciana Fregolente amava essa brincadeira. Era uma brincadeira lá do passado, de trote, que era assim: você recebia a pessoa no primeiro dia de trabalho de cueca --homens e mulheres. E a pessoa tomava aquele susto. Brincadeira babaca, de recreio, de quinta série", explicou.
"O que eu quero dizer é o seguinte: não tem nada erotizante aí, não tem nada de malicioso. As pessoas pediam, as mulheres pediam para fazer essa brincadeira de cueca."
Com relação a Dani Calabresa, ele afirma que nunca a ouviu dizer não e que entendia que poderia ter algo a mais ali. "Quando a pessoa te chama em um canto, em uma festa, te mostra fotos e vídeos pelada, que sinal é esse exatamente?", questionou. "É um sinal de não? Você não entenderia como um sinal de intimidade? Em que momento ela me disse não? Ela nunca me disse não, só me disse sim."
Marcius Melhem ainda contou que recebeu um elogio íntimo da atriz. "Uma pessoa que está incomodada com isso, um mês depois da tal festa, primeiro te chama para viajar para a Disney um mês depois da festa, e manda mensagem para você elogiando o seu pênis?", ironizou. "Uma pessoa que elogiou o seu pênis quer só a sua amizade?"
Você não pode 'desdizer' que você tinha uma intimidade, que você provocava, que você fazia brincadeiras. Se a Dani Calabresa, em qualquer momento, tivesse me dito 'não, não quero', ou dado a entender, eu teria parado imediatamente.
Marcius Melhem está sendo investigado em um inquérito policial aberto em 2020 pela Delegacia da Mulher do Rio de Janeiro e processa Dani Calabresa por danos morais.
Assista às entrevistas completas:
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