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Crisis in Six Scenes

Por que vale a pena assistir ao maior mico da carreira de Woody Allen?

Fotos: Divulgação/Amazon

A atriz e cantora Miley Cyrus interage com Woody Allen em cena de Crisis in Six Scenes - Fotos: Divulgação/Amazon

A atriz e cantora Miley Cyrus interage com Woody Allen em cena de Crisis in Six Scenes

JOÃO DA PAZ

Publicado em 24/3/2017 - 5h31

O renomado cineasta Woody Allen revelou no ano passado que nunca mais irá fazer algo para a TV. A frase um tanto apocalíptica veio após seu projeto Crisis in Six Scenes, que estreia nesta sexta (24) na Amazon no Brasil, receber críticas negativas do público e da mídia ao ser lançado nos Estados Unidos. Mas por que, então, vale a pena assistir ao maior mico da carreira do diretor de Hannah e Suas Irmãs (1986) e  Meia-Noite em Paris (2011)?

Crisis tem suas qualidades, como o humor afiado característico do cineasta, uma discussão política pertinente e uma boa personagem principal. Para fazer a série, Allen exigiu a contratação da cantora Miley Cyrus, a eterna Hannah Montana da série homônima (2006-2011) _a comédia infantil da Disney, aliás, foi o motivo de ele ter virado fã de Miley. A escolha deu certo, pois a rebeldia da atriz casa com o comportamento da personagem central da série.

A história de Crisis, ambientada na Nova York dos anos 1960, é até simples. A rotina pacata de um casal de idosos, o romancista Sidney J. Munsinger (Allen) e a conselheira de casais Kay (Elaine May), sofre uma chacoalhada com a visita inesperada de Lennie Dale (Miley), uma jovem ativista política procurada pelo FBI (a polícia federal norte-americana).

Sid, como já virou costume na filmografia do diretor, é um alter ego de Allen. Escritor com o desejo de produzir uma série de televisão, o personagem brinca com sua carreira e diz, em ummomento premonitório: "Talvez eu deva abandonar essa ideia idiota de série de televisão e voltar a escrever um livro".

Sidney é ateu, e piadas sobre religião e sobre a existência de Deus, constantes nas produções de Allen, também marcam presença em Crisis. "Meu primeiro livro se chama Que Haja Luz, sobre um proctologista que acha Deus nos lugares mais estranhos", brinca o romancista, em uma piada quase iconoclasta, típica do cineasta judeu.

As discussões de Sidney com Kay são hilárias. Ele é totalmente contrário a manter uma fugitiva da polícia em sua casa, mas simplesmente não convence a mulher com o discurso de ser o homem da casa, mantenedor do lar. Rabugento, é voz vencida pela sensatez de Kay. Ela ajuda Lennie por ter uma dívida com a família da garota devido a um episódio do passado. 

Elaine May e Woody Allen formam um divertido casal de idosos na série Crisis in Six Scenes

A existência de Deus também é assunto das conversas entre Sidney e Kay. Ambos embarcam em uma enrascada e ele dispara: "Deus vai nos castigar". Ela, porém, lembra o marido: "Mas Deus não vai te punir, você é ateu". O escritor devolve com sagacidade: "Mas, se eu estiver errado, estamos muito encrencados".

Sidney também não se dá bem nos debates com Lennie, que geram situações cômicas interessantes devido aos pensamentos bem distintos entre os dois. Ao relembrar trabalhos da juventude, quando escrevia roteiros para propagandas, a rebelde não hesita em contradizer: "[Eis] uma maneira nojenta de ganhar dinheiro". Ele responde sarcasticamente: "Sim, não é como roubar um banco, igual você faz".

Lennie é a líder do grupo fictíco Constitutional Liberation Army, de viés socialista, contra a Guerra do Vietnã (1955-1975) e a corrupção no governo norte-americano. Ela tem um poder de influência enorme e seduz ideologicamente até a mulher de Sidney.

Para o maratonador experiente, Crisis in Six Scenes é até café com leite: os seis episódios da série duram duas horas e meia. Os críticos mais ferozes apontaram que Woody Allen se esqueceu de que estava fazendo uma série e produziu um longo filme dividido em seis partes.

O telespectador poderá, sim, ter essa impressão ao ver episódios pouco atrativos e um tanto desconexos. Mas compensa ir até o fim, pois o desfecho da história é engraçadíssimo e satisfatório.

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