QUESTÃO COMPLEXA
REPRODUÇÃO/TV GLOBO
Odete Roitman (Debora Bloch) em Vale Tudo; remake tem graves problemas no roteiro e na direção
O remake de Vale Tudo virou praticamente um "saco de pancadas" nas redes sociais nas últimas semanas. Para piorar a situação, o aumento das críticas coincide justamente com o agravamento da crise que a novela das nove enfrenta na Kantar Ibope. Mas, afinal, a produção realmente merece as pedradas que está levando? A resposta não é simples, mas um ponto se destaca: mesmo longe de ser um desastre como Mania de Você (2024), o folhetim de Manuela Dias tem sim graves problemas que vão de furos no roteiro até falhas da direção.
Com quase duas centenas de capítulos, não é difícil que um erro ou outro passe pela ilha de edição e chegue até os telespectadores. Alguns deles até ganham um caráter anedótico, como a mulher que invadiu as gravações e saiu filmando Cauã Reymond com o seu celular.
A questão é que, até aqui, o remake de Vale Tudo tem acumulado falhas que --mesmo pequenas-- acabam comprometendo a sua qualidade pelo volume. Da flor que magicamente se transformou nas mãos de Raquel (Taís Araujo) à posição incorreta das peças no tabuleiro de xadrez durante a partida entre Heleninha (Paolla Oliveira) e Maria de Fátima (Bella Campos), a impressão dos telespectadores é de desleixo com o produto final.
Essas falhas não são as únicas que jogam contra o trabalho do diretor Paulo Silvestrini e da sua equipe. As cenas que reúnem vários personagens, como nas discussões entre Odete (Debora Bloch) e os filhos na casa de Celina (Malu Galli), são um bom exemplo.
A ação transcorre praticamente apenas no primeiro plano, em que os coadjuvantes estão lá apenas para fazer número. Não há reação, não há movimentação, não há camadas. Os personagens só avançam se houver indicação no texto para tal.
O telespectador que tenha assistido a qualquer folhetim de época de Walcyr Carrasco, como Êta Mundo Bom! (2016), pode facilmente perceber a diferença. O julgamento de Sandra (Flávia Alessandra), por exemplo, consegue ser mais fluido e ter mais movimentação, mesmo que o texto seja bem mais duro e teatral do que o de uma novela contemporânea como Vale Tudo.
Essa falta de movimento é imprimida justamente pela direção de Silvestrini, que também tem se mostrado bastante equivocada na hora de ajudar os atores em cenas mais dramáticas. Até aqui, as bebedeiras de Heleninha foram constrangedoras pelos motivos errados --com um excesso cênico de Paolla, que poderia facilmente ser contornado, mas que fez o público associá-la até com João Canabrava de Tom Cavalcante.
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Heleninha (Paolla Oliveira) em Vale Tudo
Mesmo com uma boa frente nos roteiros, a autora Manuela Dias deixou escapar também mais furos do que o esperado. Em um dos mais recentes, Vasco (Thiago Martins) disse ter conseguido o seguro-desemprego mesmo demitido por justa causa. Esse não foi o primeiro problema na trama --e, aí, não adianta reclamar que o público não sabe "voar".
A construção dos personagens também se mostra equivocada, especialmente a de Odete Roitman. A vilã levou nada menos do que três semanas para finalmente causar algum tipo de ojeriza no público ao ser racista com Maria de Fátima no capítulo de segunda (20).
Até então, a "vilã das vilãs" na verdade estava sendo tratada como uma "loba" pelo público. E com razão. Afinal, qual foi a grande controvérsia dela? Oferecer um emprego para Solange (Alice Wegmann)? Reclamar que Afonso (Humberto Carrão) não quer nada com a hora do Brasil? Matar pessoas em um jogo virtual? Dizer que até conhece pessoas de esquerda que são inteligentes? Mandar dar uma surra no ex-namorado que a acertou com um tapa na cara? E Manuela Dias falar depois que esse foi um movimento --do amor ao ódio-- foi planejado é desconsiderar qualquer rastro de inteligência do público.
Esse é um problema que se arrasta na Globo desde Um Lugar ao Sol (2021), que curiosamente também sofreu no Ibope: uma parte importante da história não é mostrada diretamente, fica subentendida. O público não viu Bárbara (Alinne Moraes) descobrir as mentiras de Christian (Cauã Reymond), assim como não acompanhou Odete sendo tão terrivelmente desagradável --a não ser pela boca dos outros personagens.
A personagem de Debora Bloch não é a única com graves problemas de concepção, porque Maria de Fátima também foi desfigurada a ponto de virar uma trambiqueira de novela infantil do SBT. E fica difícil acreditar que Marco Aurélio (Alexandre Nero) é um crápula se até a Bia (Maisa) de Garota do Momento já proferiu ofensas mais pesadas a Beatriz (Duda Santos) às 18h.
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Raquel (Tais Araujo) no remake
Outro ponto em que a Globo está falhando é na dificuldade de admitir que Vale Tudo não é o produto que queria oferecer ao público. As inserções com alguns telespectadores falando bem da novela na Grande São Paulo, onde a crise no Ibope é mais grave, soaram completamente artificiais.
Hoje, a emissora não pode se dar ao luxo de fingir que um produto problemático é um sucesso, como fez com várias produções nos anos 1990 e 2000. O espectador não está mais isolado na sala de casa enquanto assiste à trama, mas compartilhando o momento nas redes sociais --e, mais que isso, percebendo que outras pessoas também não estão curtindo a experiência.
A Globo obviamente não vai jogar Vale Tudo em uma fogueira em praça pública, mas precisa ter uma relação mais transparente com o público que deseja reaproximar do seu horário nobre.
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Lucimar (Ingrid Gaigher): acerto de Vale Tudo
Não há dúvidas de que a televisão aberta tem um alcance impressionante, e Lucimar (Ingrid Gaigher) prova que Vale Tudo ainda tem salvação. Uma das poucas tramas que estão funcionando na novela das nove, a briga da diarista pelos direitos do filho com Vasco realmente teve impacto direto no cotidiano --inspirando mais de 270 mil mulheres a buscarem informações sobre pensão com a Defensoria Pública, como informado pelo Correio Braziliense.
Esse é um "ouro" que a Globo não pode deixar passar, mobilizando desde as equipes do Encontro até ao Fantástico para fazer com que a repercussão jogue a favor da novela das nove.
O resultado dos primeiros grupos de discussão também vão ajudar a emissora a conduzir melhor a trama, mas é preciso cuidado para não repetir as mudanças desastrosas que ajudaram a afundar Mania de Você. Uma intervenção bem feita pode repetir o fenômeno que Manuela Dias já tinha sentido em Amor de Mãe (2019), em que a rejeição dos primeiros meses conseguiu ser revertida –principalmente no Ibope.
Leia também -> Resumo dos capítulos da novela Vale Tudo.
Vale Tudo foi exibida em 1988 e é um dos grandes sucessos da teledramaturgia brasileira. O remake da novela celebra os 60 anos da Globo. A autora Manuela Dias está responsável pela atualização da trama, e Paulo Silvestrini assina a direção artística.
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