Jornalismo investigativo
Reprodução/TV Centro América
O repórter Alex Barbosa, da afiliada da TV Globo em Mato Grosso, a TV Centro América
DANIEL CASTRO
Publicado em 13/10/2015 - 11h43
Atualizado em 14/10/2015 - 4h53
A Polícia Federal e a Polícia Militar de Mato Grosso sabiam de antemão que o jornalista Alex Barbosa, da afiliada da TV Globo em Mato Grosso, produzia uma reportagem que testaria a fragilidade do combate ao tráfico de drogas na fronteira do Brasil com a Bolívia. Barbosa e mais três funcionários da TV Centro América foram detidos segunda-feira (12) à noite quando simulavam o transporte de cocaína da Bolívia para o Brasil.
Eles trafegavam em dois carros pela BR 070 com 240 quilos de gesso em pó. Foram conduzidos à Polícia Federal de Cáceres e liberados, por volta das 3h desta terça (13), após prestarem depoimentos. O Ministério Público Federal, que na sexta-feira (9) recebeu ofício em que o jornalista comunicava a realização da reportagem, assumiu em nota ter passado a informação para a PF e a PM no mesmo dia.
O jornalista não considera ter fracassado na reportagem. "A gente ficou das 8h da manhã às 8h da noite rodando com esse carro [com falsa cocaína]. Já tínhamos rodado 600 km quando fomos abordados", disse ao Notícias da TV.
Barbosa foi detido por policiais do Gefron (Grupo Especial de Fronteira), unidade da Polícia Militar de Mato Grosso que faz combate ao tráfico por meio de policiamento ostensivo. O jornalista e equipe estavam em dois carros, um Gol e uma Parati, ambos da TV Centro América. Segundo a PM de Cáceres (MT), uma patrulha do Gefron viu os dois carros trafegando pela rodovia os abordou. Os veículos teriam levantado supeita porque estavam "baixos", devido ao peso da carga, segundo a Polícia Militar.
Em um exame preliminar, a PF constatou que o material que eles transportavam não era entorpecente. A falsa droga estava acondicionada em pacotes semelhantes aos usados por traficantes. Mesmo assim, um inquérito policial foi instaurado, e o material apreendido será analisado por peritos no Setor Técnico-Científico da Polícia Federal em Cuiabá.
Segundo policiais que participaram da operação, Barbosa e um motorista iam no carro da frente, uma Parati. No veículo de trás, seguia um cinegrafista da TV Centro América.
A reportagem não estava sendo produzida para um telejornal específico, mas a Globo no Rio estava ciente e poderia aproveitá-la, se quisesse, no Jornal Nacional. "Era, a princípio, para sair em rede nacional", diz Barbosa.
"A gente já tinha informações sobre a fragilidade da segurança na fronteira do Mato Grosso com a Bolívia. O efetivo da Polícia Federal na região é pequeno demais. Não tem monitoramento aéreo no Mato Grosso do Sul. O Gefron tem 90 homens para vigiar 900 quilômetros em quatro turnos. A gente estava procurando exemplos dessa fragilidade", afirma.
Segundo Barbosa, ele e sua equipe saíram de Cuiabá e foram até Cáceres com os 240 quilos de gesso. De lá, rodaram até a fronteira da Bolívia e voltaram para Cáceres novamente, onde almoçaram. Após captar imagens e gravar passagens, retornavam para Cuiabá, à noite, quando foram abordados pela polícia. "A gente passou pelos três vezes pelos mesmos pontos. Mostramos postos da Polícia Rodoviária vazios", conta.
Pacotes de falsa cocaína apreendida pela polícia do Mato Grosso com o repórter Alex Barbosa
Vazamento
A produção da reportagem foi informada previamente ao Ministério Público Federal, em procedimento recomendado por advogados da TV Centro América. Em ofício na sexta-feira, "com o objetivo de preservar os profissionais envolvidos na produção", Barbosa informou a procuradores da República em Cuiabá que iria realizar a reportagem, a fim "de testar a fiscalização dos órgãos competentes nas fronteiras de Mato Grosso".
Nesta terça, o Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso admitiu ter informado a polícia sobre a realização da reportagem. "O MPF informou à TV Centro América, em duas ocasiões, que não tem atribuição de autorizar ou avalizar a realização da matéria jornalística. E, na obrigação da transparência com as instituições que fazem a segurança na fronteira, o MPF comunicou a Polícia Federal", disse o órgão em nota." O mesmo dever de transparência com as instituições da Polícia Federal e com o Gefron levou o MPF a comunicar à TV Centro América, na tarde de sexta-feira que a força policial tinha conhecimento da pauta", concluiu.
A Globo, também em nota, afirmou que o material "era uma iniciativa da própria TV Centro América, para o noticiário local. Para a pauta sobre a falta de fiscalização nas fronteiras, a equipe de reportagem não usou nenhum tipo de substância ilícita. O teste comprovou que era gesso em pó e a equipe foi liberada".
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