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Análise | Jornalismo

Ao vivo na TV, impeachment reflete o Brasil conservador de verdade

Reprodução/TV Câmara

O deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) vota a favor do impeachment de Dilma, na Câmara - Reprodução/TV Câmara

O deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) vota a favor do impeachment de Dilma, na Câmara

CARLOS AMORIM

Publicado em 19/4/2016 - 5h25

As emissoras de TV abertas e os canais de notícias prestaram domingo (17) um grande serviço ao país. O Brasil real foi visto ao vivo e a cores na Câmara dos Deputados. Globo e Band acertaram ao não interferir com repórteres e narradores no que estava acontecendo no plenário, dando ao público uma oportunidade rara de conhecer seus parlamentares.

Quem acha que somos uma imensa avenida Paulista se engana. Quem imagina que as favelas são como se vê nas novelas, pior. O país de verdade é aquele representado pelos 511 deputados que compareceram à sessão do impeachment. Receberam 100 milhões de votos em 2014. Duas vezes a votação de Dilma. Saíram dos grotões, dos sertões abandonados, onde a presença do Estado moderno é vista apenas nas placas de sinalização em rodovias esburacadas ou estradas de terra. A maioria deles foi eleita por meio do compadrismo local _ou em troca de cestas básicas, dentaduras, lugar na fila do posto de saúde e coisas que tais. Este é o Brasil real.

Ao acompanhar a transmissão, as pessoas tiveram reação imediata. Perplexidade. Nas redes sociais, muita gente espantada: "Eles não sabem nem falar...". É isso mesmo. Quando vemos parlamentares nos telejornais, elegantes e articulados, são os líderes, a elite do Parlamento brasileiro. E são poucos. A grande massa é inculta, semialfabetizada e, claro, esperta além da conta.

De um ponto de vista didático, a sessão de domingo, com seis horas de transmissão ao vivo no horário nobre, teve um saldo muito positivo: mostrou claramente quem são eles. O Congresso Nacional é um reflexo perfeito do Brasil: somos conservadores, tementes a Deus, aguardamos um messias, adoramos gestos de força e truculência. Seria difícil para um Benedito Rui Barbosa escrever um roteiro como esse.

Foi possível acompanhar passo a passo a derrota de Dilma, de Lula e do PT. E com a pantomima que é peculiar às grandes decisões em plenário, onde todos querem aparecer para exibir ao expectador aquele espetáculo de "Obrigado, mamãe..." e coisas do gênero. Deus foi mais citado do que as pedaladas fiscais. Acabou em festa, comemorando o desastre de um modelo político destruído pela crise econômica e pelo atropelamento político. E nesse ponto, a transmissão foi impecável, sem molduras, apesar de a Globo fazer uma confusão com os números a favor do governo, misturando ausências e abstenções com os votos contra o impeachment. Isto afetaria o quorum, não o resultado.

E foi possível observar com clareza a tendência conservadora entre os deputados, fato que o Ricardo Boechat destacou na Band. Muitos desses deputados, provavelmente a maioria construída domingo, querem a revogação do Estatuto do Desarmamento e do Código da Infância e da Juventude; querem aumentar o encarceramento; são contra a pesquisa com células-tronco embrionárias; contra a igualdade de direitos entre parceiros do mesmo sexo; são contra os poderes de investigação do Ministério Público. No fundo, querem reescrever a Constituição de 1988.

Não podemos reclamar. Os caras foram escolhidos por voto direto e livre. Assistindo ao circo midiático do impeachment, ficou bem claro que há um país real e outro imaginário. Este último, habitado por sonhadores e idealistas, está mais para roteiro de novela do que para o mudo real. Como vivemos num regime de amplas liberdades, cada rede de televisão escolheu o seu caminho. Silvio Santos, seguindo a tradição do SBT nos grandes enfrentamentos, preferiu brincar de outra coisa. Deu certo.


CARLOS AMORIM é jornalista. Trabalhou na Globo, SBT, Manchete e Record. Ocupou cargos de chefia em quase todos os telejornais da Globo. Foi diretor-geral do Fantástico. Implantou o Domingo Espetacular (Record) e escreveu, produziu e dirigiu 56 teledocumentários. Ganhou o prêmio Jabuti, em 1994, pelo livro-reportagem Comando Vermelho - A História Secreta do Crime Organizado e, em 2011, pelo livro Assalto ao Poder. É autor de CV_PCC - A Irmandade do Crime. Criou a série 9 mm: São Paulo, da Fox. Site: www.carlosamorim.com


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